A Univaja

(1) Fontes: Justiça do Amazonas dá 5 dias para Funai se manifestar sobre expulsão de missionários de terra indígena – Jornal O Globo;

Indígenas vão à Justiça contra missionários na Amazônia para impedir genocídio.

Acessos: 25/05/21.  

A União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (UNIVAJA) é uma entidade civil de direitos privados sem fins lucrativos, partidários e religiosos, com sede e foro em Atalaia do Norte, no estado do Amazonas. Respaldada pelo Art. 232 da Constituição/88, a UNIVAJA manifesta o protagonismo dos povos indígenas do Vale do Javari em estreito diálogo com outras articulações e organizações indígenas, como a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB, criada em 1989) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB, criada em 2005).

A UNIVAJA tem, dentre outros objetivos, promover a articulação dos povos indígenas do Vale do Javari, visando a defesa dos direitos constitucionais, conscientizando-os para sua autonomia e valorizando seus conhecimentos tradicionais. Adicionalmente promove e atua junto aos órgãos competentes na proteção e defesa dos direitos indígenas, tais como a proteção de seus territórios, e na promoção de políticas públicas que beneficiem as comunidades na área de saúde, educação e auto sustentabilidade.

Desde 2020, a partir de reunião da 6ª Assembleia Geral da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari, realizada entre os dias 11 a 14 de março, na aldeia matsés Nova Esperança (rio Curuçá, na TI Vale do Javari), a coordenação da UNIVAJA é composta por um colegiado que envolve (1) o coordenador, (2) o vice-coordenador, (3) o representante em Brasília (DF) e o (4) procurador jurídico. Tal colegiado representa a coletividade dos indígenas que habitam na área da TI Vale do Javari. Desde a sua criação, em 05/04/2010, a UNIVAJA tem atuado com parcerias e objetivos diversos, alinhados aos seus propósitos fundamentais.

No contexto da pandemia da COVID-19, a imprescindibilidade, a efetiva atuação e o protagonismo indígena se manifestou por intermédio da UNIVAJA que, no âmbito jurídico, colaborou com a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 709 (ADPF 709). Trata-se de um cenário inédito na história constitucional do Brasil. Por meio da ADPF 709, um conjunto de advogados indígenas – via APIB e suas articulações com outras instâncias, como a UNIVAJA –, advertiu o governo federal por sua omissão no combate ao novo coronavírus em relação às populações indígenas, alertando sobre o risco de genocídio destas populações. 

A ação, protagonizada por estes advogados indígenas, exigiu do Supremo Tribunal Federal (STF) atitudes, como a instalação das barreiras sanitárias em territórios ocupados por povos indígenas isolados e de recente contato, como o Vale do Javari; o atendimento a todos os indígenas, sem restrição àqueles residentes em perímetros urbanos etc. Nesse contexto inédito, a UNIVAJA atuou representando os povos da TI Vale do Javari através do seu procurador jurídico.

Durante a pandemia, a ADPF 709 foi apenas uma das instâncias de atuação da UNIVAJA. Ainda em junho de 2019, a UNIVAJA se dirigiu à sociedade brasileira e à comunidade internacional denunciando o avanço da COVID-19 na TI Vale do Javari. No início da pandemia da COVID-19, a UNIVAJA, por meio da procuradoria jurídica, através de ação civil pública, iniciou a insurgência mais recente contra a ocupação ilegal de missionários em terras indígenas. O judiciário brasileiro reconheceu o direito dos povos indígenas do Vale do Javari, especificamente, o seu direito de viverem sem a presença missionária nas aldeias.

Enquanto o novo coronavírus se proliferava no Brasil, missionários e garimpeiros aproveitaram o contexto pandêmico para tentar ingressar ilegalmente na TI Vale do Javari. Os missionários ambicionavam estabelecer contato forçado com uma parcela dos isolados korubo. Esse planejamento foi barrado através das denúncias do movimento indígena, a UNIVAJA, que entrou com ação na justiça(1).

A Equipe de Vigilância da UNIVAJA (EVU)

A Equipe de Vigilância da UNIVAJA (EVU), emergente no segundo semestre de 2021, é o resultado da confluência de fatores mencionados nas seções anteriores. Por um lado, a ineficiência do órgão indigenista, a FUNAI, em garantir a proteção territorial do Vale do Javari. Por outro, o consequente aumento das invasões em diferentes porções da TI Vale do Javari. Esse cenário ameaça a integridade física, sanitária e, inclusive, alimentar dos povos da TI Vale do Javari, pois com o aumento da caça e pesca predatória e ilegal, os indígenas veem a redução drástica dos recursos base de sua alimentação. Diante disso, os indígenas da TI Vale do Javari passaram a demandar a atuação da UNIVAJA. 

Desde 2020, a UNIVAJA enviava às autoridades competentes – FUNAI, Ministério Público Federal (MPF) e Polícia Federal (PF) – ofícios registrando as invasões na TI Vale do Javari. Em resposta, as autoridades demandavam informações mais qualificadas acerca das invasões na terra indígena. A partir disso, a EVU surgiu como um instrumento para a busca de direitos e autodeterminação indígena, previstos na Constituição outorgada em 1988. Trazendo o protagonismo indígena, amplia as estratégias para proteção do território.

A ideia base da EVU nunca foi realizar a “fiscalização” territorial, papel que cabe ao Estado brasileiro através da FUNAI, e sim realizar a “vigilância” de algumas partes da TI Vale do Javari para fornecer às autoridades competentes ofícios e relatórios com informações qualificadas acerca dessas invasões: modo de entrada e saída dos invasores na TI; tipo de materiais e embarcações utilizadas; tipo de ilícitos ambientais extraídos etc. 

A partir da formação e capacitação técnica da EVU, a UNIVAJA prevê o controle social mais dinâmico e pragmático, utilizando ferramentas tecnológica modernas e conceitos atuais sobre legislações, realizando registros factuais e científicos sobre a realidade de nosso território, auxiliando assim (e não substituindo) o Estado no cumprimento de seus deveres. 

A primeira viagem de trabalho da EVU foi realizada de 26/08 a 20/09/21 na Terra Indígena Vale do Javari. Os resultados almejados e os alcançados emanam da vontade dos povos indígenas de proteger o território, além de ser útil para subsidiar as ações do Estado no cumprimento de suas responsabilidades e na proteção dos direitos indígenas. Assim, no relatório da primeira missão realizada pela EVU – intitulado “Expedição de monitoramento e vigilância da EVU na TI Vale do Javari: rios Itaquaí, Ituí e Quixito” (56 páginas) –, encaminhado às autoridades competentes, responsáveis pela fiscalização e proteção territorial do Vale do Javari, a UNIVAJA mapeou 67 localizações, com coordenadas de Sistema de posicionamento global (GPS), que indicam a latitude e a longitude de pontos de invasão na TI, como varadouros, acampamentos de invasores, e vestígios de materiais utilizados pelos invasores. 

As iniciativas da EVU estão alinhadas com a visão política da UNIVAJA, que foca a autonomia dos povos indígenas do Vale do Javari para decidir e participar de todas as questões que possam impactar suas vidas.